CONTAMINAÇÃO CRÓNICA POR GLIFOSATO EM PORTUGAL
100% de contaminação com esta substância cancerígena
A
Plataforma Transgénicos Fora lançou uma iniciativa em 2018 para testar a
presença de glifosato em voluntários portugueses. As análises, realizadas em
julho e em outubro com o mesmo grupo, demonstram uma exposição recorrente ao
herbicida e apontam para uma contaminação generalizada por glifosato em
Portugal.
Pela
primeira vez em Portugal foi possível calcular os valores de exposição efetiva
ao glifosato (que levam também em consideração o AMPA - substância em que o
glifosato se transforma quando começa a degradar-se) e os resultados, quando
comparados com outros países europeus,(1) mostram uma
diferença preocupante: enquanto que na média de 18 países se verifica que 50%
das amostras estão contaminadas, as duas rondas de testes em Portugal estavam
acima desse valor – e em outubro a contaminação foi detetada em 100% das
amostras, tal como apresentado na imagem abaixo.
O glifosato
é o herbicida mais usado em Portugal e causa cancro em animais de
laboratório, estando classificado pela Organização Mundial de Saúde como
carcinogéneo provável para o ser humano.(2) Embora a
Comissão Europeia tenha chegado a conclusão diferente, informações recentes
mostram que essa avaliação científica resultou de graves conflitos de
interesses, ao ponto de plagiar sistematicamente os pontos de vista da
indústria.(3)
O valor
médio da contaminação das amostras foi de 0,35 ng/ml em julho (valor mais alto:
1.39 ng/ml) e de 0,31 ng/ml em outubro (valor mais alto: 1,20 ng/ml), o que é
cerca de três vezes (300%) acima do limite legal na água de consumo.(4) Considerando
apenas as crianças verifica-se que em julho estavam próximo da média, enquanto
que em outubro estavam claramente acima (com 0,44 ng/ml). O facto de existir
uma contaminação considerável em crianças já tinha sido detetado em 2016(5) e é um sinal
de alerta para a necessidade de conhecer melhor qual a exposição real da
população portuguesa em termos de estratificação etária, ao longo do tempo e
nos diferentes pontos do país.
Contaminação
permanente
Tanto
quanto se sabe a maior parte do glifosato ingerido ou inalado pelo organismo é
excretado pela urina em menos de um dia. Isso significa que a contaminação
detetada na segunda ronda de análises provém de novos contactos com o herbicida.
Quando se deteta contaminação ao longo do tempo isso significa que houve
exposição sucessiva do organismo – ou seja, há glifosato a recontaminar
constantemente a população portuguesa.
Os
voluntários de 2016 e de 2018 revelam dimensões diferentes da população
nacional. Em 2016 anos houve uma amostragem tão aleatória quanto possível:
nenhum dos voluntários escolhidos consumia agricultura biológica ou estava
ligado a alguma corrente ou preocupação particular com a alimentação. Já em
2018 os participantes inscreveram-se por iniciativa própria e tiveram de pagar
o custo da 1a análise (78.20€). Cerca de 80% dos inscritos identificaram-se
como consumidores de alimentos biológicos com alguma regularidade.
Em termos
de resultados os participantes de 2016 estavam significativamente mais
contaminados, o que aponta para um possível efeito protetor nos consumidores
de agricultura biológica. Por outro lado a alimentação não é o único
veículo de contaminação: a água e o ar são fontes igualmente relevantes e a época
do ano também tem influência (usa-se mais glifosato no início da primavera,
precisamente a altura em que as análises de 2016 tiveram lugar).
A
coordenadora da campanha Autarquias Sem Glifosato/Herbicidas, Dra. Alexandra
Azevedo, alerta: "Tivemos conhecimento de análises em águas superficiais
na bacia do rio Douro que revelam contaminação 70 vezes acima do limite máximo
legal. Ainda há autarquias que lavam as ruas com glifosato mas já há outras que
abandonaram os herbicidas e provam no terreno que as alternativas
existem."(6)
A bióloga
Margarida Silva, da Plataforma Transgénicos Fora, lembra: "A ciência mais
recente mostra que o glifosato altera profundamente a composição do nosso
microbiota gastrointestinal. Quando esse equilíbrio fica comprometido podem
surgir doenças graves, desde diabetes tipo 2 a aterosclerose, a obesidade e até
cancro. Que mais evidências são necessárias para que o governo cumpra a sua
função de proteger a nossa saúde?"
Apelo ao
governo
É verdade
que o trabalho realizado pela Plataforma Transgénicos Fora não permite retirar
conclusões finais, mas o peso das evidências não pode ser ignorado. Desde 2016,
em que a Plataforma mostrou pela primeira vez que a situação portuguesa era
inesperadamente preocupante, não foram ainda tomadas pelos responsáveis
governamentais quaisquer medidas que permitam desvendar o que se passa de facto
no país e iniciar um caminho de redução do uso dos herbicidas à base de
glifosato.
Neste
contexto, a Plataforma Transgénicos Fora apela ao Governo Português para:
1. Lançar
um estudo abrangente sobre a exposição dos portugueses ao
glifosato.
2. Proibir a venda de herbicidas à base de
glifosato para usos não profissionais.
3. Tornar
obrigatória a análise ao glifosato na
água de consumo.
4. Acabar
com o uso de herbicidas sintéticos na limpeza urbana.
5. Apoiar
os agricultores na transição para uma agricultura pós-glifosato nos
próximos anos.
Como
proteger-se do glifosato e seus efeitos
A
Plataforma Transgénicos Fora divulga também hoje um documento com sugestões
detalhadas para quem estiver interessado em limitar a sua exposição ao
glifosato. O documento pode ser descarregado em https://tinyurl.com/pistas2019
Referências
(1) Hoppe, H-W. (2013).
Determination of Glyphosate residues in human urine samples from 18 European
countries. Report Glyphosate MLHB-2013-06- 06. Medical Laboratory Bremen,
Haferwende 12, 28357 Bremen, Alemanha, 12 de junho.
https://tinyurl.com/hoppe2013
(2) Guyton, Kathryn Z., et al.
(2015). "Carcinogenicity of tetrachlorvinphos, parathion, malathion,
diazinon, and glyphosate." The Lancet Oncology 16.5: 490-491.
(3) Ferreira, Ana B. (2019).
Glifosato. Especialistas contratados pela UE copiaram relatórios da Monsanto.
Diário de Notícias, 15 de Janeiro. https://tinyurl.com/yblgc2kf
(4) O limite imposto pela
Directiva 98/83/CE do Conselho de 3 de novembro de 1998 relativa à qualidade da
água destinada ao consumo humano é de 0,1 ng/ml.
(5) Plataforma Transgénicos Fora
(2016). Glifosato: o herbicida que contamina Portugal. 29 de abril.
https://tinyurl.com/glifosato2016portugal
(6) O mapa das autarquias que
aderiram ao compromisso de não usar glifosato e outros herbicidas está em
https://tinyurl.com/autarquiasmapaglifosato
A Plataforma Transgénicos
Fora é uma estrutura composta por voluntárias/os que oferecem o seu tempo
para uma luta que é de todos. São estas as entidades não-governamentais da área
do ambiente e agricultura que apoiam formalmente o trabalho da Plataforma:
AEPGA, Associação para o Estudo e Proteção do Gado Asinino; CAMPO ABERTO,
Associação de Defesa do Ambiente; CNA, Confederação Nacional da Agricultura;
CPADA, Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente; GAIA,
Grupo de Ação e Intervenção Ambiental; GEOTA, Grupo de Estudos de Ordenamento
do Território e Ambiente; LPN, Liga para a Proteção da Natureza; MPI, Movimento
Pró-Informação para a Cidadania e Ambiente; PALOMBAR, Associação de Conservação
da Natureza e do Património Rural; QUERCUS, Associação Nacional de Conservação
da Natureza e ZERO, Associação Sistema Terrestre Sustentável. Contactos: info@stopogm.net
e www.stopogm.net